Oi, meu nome é Arthur. Eu amei
este nome. É forte!
Sou de Duque de Caxias, estado
do Rio.
Fui gerado no coração do Papai
do Céu com muito amor, através do meu papai e da mamãe. Eles esperaram
ansiosamente minha chegada. Consegui, por 9 meses, sentir todo carinho e amor quando
conversavam comigo, brincavam, compravam minhas coisinhas, montavam meu quarto.
Simples, mas tudo lindo! Mamãe estava toda babando.
Eu só ficava um pouco assustado
quando assistiam TV e comentavam as notícias. Falavam de política, da situação
do país e, claro, da violência, principalmente em nossa comunidade, nossa
cidade, nosso estado.
Eles sempre foram humildes, pessoas
sonhadoras. No entanto, às vezes, esses sonhos são desviados da rota planejada,
mesmo contra nossa vontade.
Prestes a vir ao mundo como
minha família sonhou, no último dia do mês de junho deste ano, 2017, minha
mamãe saiu e, de repente, se viu no meio de um tiroteio entre policiais e bandidos
traficantes. Aquela violência de que ela e o papai falavam estava diante de
seus olhos agora. Pude sentir o desespero dela, temente que algo pudesse
acontecer comigo.
E aconteceu. Infelizmente
aconteceu.
Uma bala perdida atingiu minha
mamãe, bem na região daquele barrigão, meu abrigo até então.
Rapidamente ela foi atendida e,
com urgência, me tiraram dali porque eu corria risco de morte.
- Nem nasci ainda, como é que
vou morrer? – eu pensava.
Começava ali uma batalha. Constataram
de fato o ocorrido. Mesmo protegido, antes de eu sair do ventre da mamãe para
conhecer esse mundo aqui fora, aquela bala de arma de fogo perfurou o útero
dela e me atingiu. Percorreu algumas partes do meu corpo. Nem sei ao certo por
onde essa bala passou. Doeu tanto, sangrou tanto... Nunca tinha sentido tamanha
dor. E eu que pensei que a dor mais forte que eu sentiria seriam as cólicas nas
madrugadas. Quanta inocência a minha! Pude imaginar também a dor da minha mamãe.
Com certeza, bem mais que física. E meu papai? O que será que ele sentiu ao
saber que, em poucas horas, nós viramos notícia no mundo inteiro?
Estou rezando desde aquele
momento em que, aleatoriamente, fomos injustamente atacados. Eu senti que tinha
sido grave. Está sendo bem triste. Não pude ir ao encontro do mundo como as
outras crianças. O mundo veio de encontro comigo, me afrontando friamente. Um
mundo diferente do que eu imaginava. Um mundo sem cores, tenebroso. Abreviaram
meu tempo no útero da mamãe.
Por quê?
Até agora ela não me pegou no
colo, não está aqui comigo. Sinto falta. Estou aqui em um hospital, ainda em
estado muito grave. Ela está em outro. Deve estar preocupada comigo. Eu quero
que a mamãe fique bem. Eu sei que Papai do Céu vai me salvar. Não tenho só um
nome forte. Eu serei pra sempre forte. Rezem por ela.
Estou cheio de aparelhos no
corpo e ouvi os tios falando aqui que existe a chance de eu andar só de cadeira
de rodas porque a bala machucou minha coluna. Mas eu, como eles, acredito em
milagre e que isso possa ser revertido. Eu já estou melhorando. Fiz muitos planos
para quando eu deixasse aquela barriga linda e tão amada.
Eu quero jogar bola com meu
pai, apostar corrida com ele, ficar na calçada de casa, correr com as outras
crianças, ir pra escola e ter um montão de amiguinhos. Brincar de super-herói,
soltar pipas e aprender a voar como elas. Quero crescer, trabalhar e ajudar o
pessoal da comunidade.
Tenho poucos dias de vida. Não
estou gostando daqui, embora os tios sejam legais. Estão cuidando de mim, me
acalmando, me ajudando a viver. Acho que assustei todo mundo por aqui com essa
situação. Porém eles foram, como sempre, tocados pelo Papai do Céu e tiveram
compaixão para com a gente. Estão se doando para que minha mamãe e meu papai me
peguem logo no colo, como tanto desejaram, e me levem pra casa. Não vejo a hora
de mamar e ficar protegido.
Sinto medo.
Também fico triste porque agora
eu entrei para a estatística do estado do Rio de Janeiro como um caso de
violência fora do comum. Serei de novo notícia na retrospectiva no final do ano
na TV. Vão falar outra vez como aqui é perigoso, que falta segurança, mostrando
gráficos que confirmam o crescimento dos casos de crueldade e o número de gente
inocente morta minuto a minuto.
É muito triste...
Bem... Preciso descansar pra me
recuperar.
Continuem a orar por mim e pela
minha família. Minha briga pela vida começou antes de eu nascer. Agora, do lado
de cá, estou resistindo. Eu vou conseguir, vocês vão ver. Assim como minha
família, eu sei que vocês estão esperando eu ir pra casa. Não vejo a hora de
dormir no meu berço lá no meu quartinho preparado pela mamãe e pelo papai.
Com amor,
Arthur
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